segunda-feira, 9 de julho de 2012

A música na cabala


                                Geralmente afirma-se que há dois estilos distintos de música. Vamos chamá-las, por conveniência, de "música ocidental", a música que se origina da sociedade ocidental, e "não-ocidental", aquela derivada de outras culturas, especialmente aquelas do Leste e da África. A música ocidental é geralmente reconhecível como "música orientada para um objetivo". Isso significa que a música é narrativa em sua estrutura, consistindo de uma série de "eventos" progressivos, por assim dizer. O ouvinte sente a progressão da música, e isso evoca uma sensação de movimento dentro dele. Parece que a música tem uma destinação, e leva o ouvinte em sua jornada.
                                 A música não-ocidental é caracterizada por um prolongamento de uma única nota, ou um grupo seleto de sons que continua num padrão estabelecido durante toda a melodia. Este tipo de música provoca um estado mais contemplativo, evocando no ouvinte uma sensação atemporal e de espaço interior.
                                  Apropriadamente, estes humores da música refletem a teosofia essencial dessas duas civilizações. No Ocidente, a crença predominante é que a criação começou num período de tempo, pois o tempo é linear, culminando num futuro: criação, revelação e finalmente redenção. Refletindo essa realidade, a música que o Ocidente produz segue este padrão. Começa, atinge um ponto alto e chega ao clímax. Em contraste, no Oriente, onde o tempo é visto como cíclico, sem início, meio e fim, sua música também é cíclica e repetitiva.
                                   A Cabalá e os ensinamentos místicos judaicos, em certo nível, fundem estes dois tipos. Sim, a criação começou em certo ponto no tempo, e o tempo em si foi criado; mesmo assim, a criação é contínua, momento a momento de novo. Nada está meramente no passado, ou esperado puramente no futuro. Tudo está contido no eterno presente. Assim, a música que a mística judaica produz, especialmente as canções dos chassidim conhecidas como nigunim, refletem estes dois espectros musicais. Alguns nigunim são estruturados e progressivos, Estas melodias são "sofisticadas" para o ouvido ocidental, consistindo de início, um corpo e um clímax. Há outros nigunim formados pela repetição de sons únicos, individuais, com poucas palavras ou sem quaisquer palavras. E alguns contém os dois.
                                     Quando Nietzsche sugeriu que "o fogo mágico da música" deve ser encontrado em sua anti-racionalidade, e aquilo que ele buscava na música era sua "irracionalidade extasiante", a mística judaica procura desvelar dentro da música a sua transcendência. Talvez não a transcendência dentro da música em si, pois alguns argumentam que a música nada mais é que "ar sonoro", ou como disse Leibniz, "aritmética inconsciente"; ao contrário, a reação à música, a transcendência atingida à medida que se reage à música.
                                     Uma melodia sem palavras – como grande parte da canção mística judaica, especialmente chassídica – é a maneira pela qual dois indivíduos podem se comunicar num nível transcendente da alma. Qualquer falha no modo de comunicação verbal pode ser reparada criando-se um conduíte que transcende as palavras. Quando uma pessoa se sente alienada de sua Fonte, ou de seu irmão o ser humano, uma melodia sem palavras que existe num âmbito que desafia as distinções, separações e desarmonia, é o remédio mais adequado, provocando uma unidade de almas.

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